sexta-feira, 4 de novembro de 2011

CONTOS DE FADAS X CONTOS BÍBLICOS


È comum ouvirmos as seguintes frases: “Não faça isso porque o Papai do Céu não gosta”; “Criança bonita não age desse jeito”; “Que coisa feia! Deixa o Papai do Céu muito triste”, e muitas outras com o mesmo teor. Essas e outras frases estão baseadas nos contos bíblicos.

Tanto os contos bíblicos como os contos de fadas falam dos problemas existenciais humanos que são universais. O que os diferencia é a sua orientação. Os primeiros possuem uma orientação para o Divino. Os segundos para o relacionamento com outros seres humanos. E não há nada de errado com esses contos como literatura, a não ser o modo como nós, adultos, os utilizamos com relação às crianças. 

Os contos bíblicos dizem “como o homem deve ser e viver para conquistar o direito de entrar no paraíso. Nesses contos Deus pede aos homens que sejam bons, que respeitem o próximo, que controlem seus instintos negativos, seus sentimentos ruins e suas tendências inconscientes. Apesar de tudo, ainda será julgado para ver se pode (ou não) entrar no Céu.

Tudo isto fica muito confuso para a criança, cujo pensamento é animista (que os objetos tem vida) ou, evoluindo um pouco, um pensamento literal (acredita que se cumprirá o que foi dito). Além do mais, quando utilizamos o pedido de Deus com a criança, o fazemos em tom de ameaça: Deus não gosta, fica triste e te punirá.

Um outro ponto, é o que Deus pede aos homens: sublimar desejos, tendências e instintos. Se a criança está numa fase animista ou literal, será que ela compreende o que é ser bom? O que é respeitar o próximo se ela ainda está na fase egocêntrica? Se a criança nem ao menos se conhece, como poderá controlar seus pensamentos e ações no dia a dia? Se os instintos humanos são inconscientes até mesmo para os adultos, será que a criança entenderá esse pedido?

Evidentemente, concordo que devemos educar a criança e repreendê-la quando faz algo que não está correto. Mas, poderíamos deixar Deus de fora disso, pois em  vez de mostrarmos um Deus de amor e bondade, mostramos um Deus temperamental e vingativo que não a deixará entrar no Céu porque, num determinado momento, não fez o que Ele pediu. Mas, naquele momento, poderia estar incomodada com pensamentos de ciúmes, de raiva ou ódio por alguém ou por alguma coisa e reagiu de acordo com seus sentimentos e emoção.

Tendo um pensamento animista ou literal, a criança acredita que realmente Deus ficou zangado, triste e que Ele não a acha bonita e boa. Este acreditar gera sentimentos de culpa, que é muito mais nocivo para sua vida do que sua reação momentânea.

Já os contos de fadas trabalham as mesmas coisas e de uma forma que a criança compreende porque falam a linguagem das crianças. Eles mostram o jeito correto de ser, de agir e pensar dentro do pensamento religioso e sem que a culpa se instale. Por que não tê-los como aliados na educação das crianças?

Não quero com isto dizer que não se deva dar um ensino religioso para as crianças. Ao contrário, acho até muito importante, O que se pede é que se mude o discurso. Em vez de dizer que Deus não gosta, que tal dizer que Deus quer que a criança seja cada vez melhor?

Leia os textos anteriores.
Fonte:
BETTELHEIM, Bruno. “A Psicanálise dos Contos de Fadas”, Ed Paz e Terra,

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