sexta-feira, 25 de março de 2011

A ESCOLA E A ALFABETIZAÇÃO

Há mais de quatro décadas que as estatísticas mostram que 50% das crianças que ingressam no 1º ano do Ensino Fundamental não conseguem se alfabetizar. Muitos estudos têm sido realizados na tentativa de se detectar as causas desse fracasso. Ora afirmam que o problema está nos alunos, ora na precária capacitação dos professores, ora nos métodos e meios alfabetizadores e, recentemente, tem sido questionada a validade do código escrito. Mas, nenhuma resposta ainda foi encontrada.

A escola tem como função fazer a criança se apropriar do código escrito (letras) e adquirir as habilidades da leitura e da escrita. Em outras palavras, fazer com que o sujeito adquira a mecânica da língua escrita, transformando sons em símbolos (escrita) e os símbolos em sons (leitura). Mas, ao desempenhar essa função, preocupada com a norma culta, confunde dois processos diferentes e importantes, mas que um depende do outro. São eles: o processo de aquisição da língua e o processo de desenvolvimento da língua materna.

O processo de desenvolvimento da língua materna (oral ou escrito) é aquele que perdura a vida inteira e não tem interrupções. É aprendido no convívio e na relação com a família, com os grupos sociais a que pertence e com a própria sociedade. Estamos sempre aprendendo algo novo.

O processo de definição destes processos determina o conceito do que é alfabetização para a escola e seus agentes. No processo de desenvolvimento da língua, ler e escrever estão ligados com os significados, como um processo de representação, que visa a comunicação e a aquisição do conhecimento, enquanto no processo de aquisição da língua, ler e escrever decorre da aprendizagem das letras do alfabeto.

Esses processos também definem os rumos que a escola deve tomar, pois dependendo do conceito que a escola tem de alfabetização, escolherá os métodos, os materiais, os meios e determinará a ação dos professores. Por exemplo, o método fônico enfatiza o desenvolvimento da língua e o método global (analítico ou sintético) a aquisição da língua.

A escola sempre valorizou o padrão culto da língua escrita e continua valorizando. Por seu julgamento de valor, censura a língua oral espontânea, Segundo Magda Soares (1984), a criança que não lê, ou que não escreve de acordo com esse padrão, é discriminada..


A alfabetização é um processo complexo e plural onde estão envolvidos múltiplos enfoques e diferentes contextos culturais.  Ainda mais num país como o nosso. Um país muito grande e com culturas regionais diferentes, sem contar que milhares de crianças residem na zona urbana ou na zona rural, e  todas apresentam uma especificidade no falar e no escrever. Mas, a escola esquece e ajuda a aumentar o preconceito e a discriminação de crianças e de suas famílias por terem sido aculturados, nesta ou naquela região ou localidade, atribuindo a elas qualificações pejorativas como as de “déficit linguístico” ou “déficit cultural”. 

A alfabetização ainda se acha envolvida com outras facetas: as psicológicas, as psicolinguÍsticas, as sociolingüísticas, as lingüísticas, as neuropsicológicas, as neurolínguísticas etc. E cada faceta está ligada a outros processos, o que a torna  cada vez mais complexa. Mas, a simples compreensão destas facetas,  não elimina o fracasso.

Magda Soares (1984) afirma que falta uma teoria própria da Alfabetização. Uma teoria que direcione a ação, que estruture o processo, que organize a prática e reúna dados coerentes que sirvam para a análise de diversas áreas do conhecimento, além de integrar e esclarecer cada um dos elementos desse processo. Apesar da sugestão de Soares feita a 24 anos atrás,  essa teoria ainda não existe. 


Quantas crianças  precisarão enfrentar o fracasso da alfabetização para que se faça alguma coisa?




Baseado no texto de Magda BecKer Soares, apresentado no XVI Seminãrio da Associação Brasileira de Tecnologia Educacional (ABT), em Porto Alegre, novembro de 1987

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